Linux Foundation adoraria trabalhar com a Microsoft


Diretor executivo da fundação diz em entrevista que está aberto a colaborar com a Microsoft e aborda outros temas polêmicos do software livre.

Jim Zemlin, diretor executivo da Linux Foundation, falou a Paul Krill, editor do InfoWorld, sobre o papel da organização, Linux no desktop e no mundo móvel, sobre a abertura de protocolos anunciada pela Microsoft e sobre as perspectivas de colaborar com a empresa de Bill Gates, entre outros temas. Confira.

InforWorld: Qual o papel da Linux Foundation?
Jim Zemlin: Obviamente somos a casa de Linus Torvalds [criador do Linux]. Focamos em três áreas principais da plataforma. A primeira área é promover o Linux como solução tecnológica, em computação embutida, móvel, servidores e desktops. Nós respondemos pela competição de mercado em nome da plataforma, portanto quando os concorrentes estão espalhando medo, incerteza, e dúvida sobre o código aberto, ou se há uma falta geral de entendimento das práticas de licenças de código aberto ou práticas de governo, nossa organização desempenha o papel de educar a indústria e os usuários finais sobre esses assuntos.

Nós protegemos a plataforma ao permitir que pessoas como Linus Torvalds trabalhem como membros da fundação para que possam ser atores neutros em projetos de colaboração em massa, como o Linux. Nós gerenciamos a marca registrada Linux. Nós temos um fundo de defesa legal para a plataforma. Nós trabalhamos com o Escritório de Patentes e Marcas Registradas e em assuntos de qualidade de patentes. E, finalmente, trabalhamos para padronizar a plataforma Linux.


Que tipo de proteção legal o Linux exige? As alegações da Microsoft de que há código patenteado por eles no Linux já teve algum efeito?
Eles falaram sobre patentes que a Microsoft detém em uma série de áreas. E não revelaram quais seriam, mas de maneira geral eles sentiam que a tecnologia deles se sobrepunha à nossa. Não, nada resultou disso porque todo mundo tem patentes de tudo ultimamente em software.

Vocês têm um fundo para defesa legal. As pessoas devem ter preocupações legais ao usar o Linux?
Assim como em outras grandes plataformas de software, vai haver oportunistas que vão tentar prejudicar a plataforma. O SCO Group foi um bom exemplo disso. Na verdade, o fundo legal foi criado para assistir a defesa da plataforma no processo da SCO.

E o que houve neste caso?
A SCO perdeu o processo, foi decidido que não houve infração de direitos autorais na plataforma Linux, e foi provado que a Novell de fato tinha os direitos autorais do software que a SCO alegava ser seu. A SCO foi retirada da lista da Nasdaq e agora está em processo de falência.

Há algo acontecendo no sentido de usar a versão 3 da GNU General Public para o Linux ou não vai acontecer?

Não está acontecendo hoje. No futuro, pode ser, mas acho improvável a esta altura. Linus, que tem muita influência sobre a decisão, disse publicamente que não está interessado na GPL3 no momento.

O Linux já se estabeleceu no servidor. Como está o progresso no desktop?

É um ano de investimento para o Linux. Estamos começando a ver algumas alavancas para o sucesso da plataforma serem acionadas mais dramaticamente que nunca.

Se você pensa no que faz o sucesso de uma plataforma de desktop, o fato de o Windows vir pré-instalado na maior dos computadores comprados no mercado, obviamente é uma grande vantagem. E estamos começando a ver companhias fazer o mesmo com o Linux.

Começamos a ver companhias como a Asus e seu Eee PC, que vem com Linux pré-instalado e custa, acredito, menos de 400 dólares. [...] E vemos essas ofertas sendo replicadas pela Everex, no produto CloudBook. A Lenovo também está oferecendo o Linux nas suas máquinas série X. A Dell anunciou no último ano que vai pré-instalar o Ubuntu Linux nos seus notebooks.

Portanto, estamos começando a ver os OEMs pré-instalando o Linux pela primeira vez, o que é interessante, mas quando você olha mais a fundo, o mais interessante é: por que eles estão fazendo isso? Por que o Linux é mais funcional que nunca? A resposta é sim, está mais funcional. Mas tem também tem os custos do Windows. Em um PC de 300 a 400 dólares, é 30% a 40% do preço.

É não só é um dos maiores componentes de um PC, como também é o de maior margem, certo? Olhando para o mercado de ações, você vê que a Microsoft tem cerca de 30% de lucro líquido. Você tem a Intel lucrando 15%, a Dell 5%, então empresas como Dell ou Asus ou Lenovo, todas olham para essas margens, e dizem: “Por que não criar meu próprio sistema operacional e vender com o aparelho?”.

Continuamos a ouvir que, exceto pelos Estados Unidos e alguns outros lugares, a maior parte do acesso à internet será feita por dispositivos móveis.
Sim. Deixe-me falar sobre o Linux neste mercado. Estamos vendo a emergência de várias plataformas baseadas em Linux. O Google tem uma plataforma chamada Android. É uma plataforma baseada em Linux e eles estão preparando um kit de desenvolvimento de software (SDK) e trabalhando com fabricantes de aparelhos e operadoras de telecomunicações para garantir a adoção no mercado. Há um segundo grupo, a LiMo Foundation, que reúne fabricantes como Samsung, LG, Motorola, e outros, na criação de uma plataforma referência em Linux para seus dispositivos. Há ainda uma organização chamada OpenMoko, que está criando um aparelho completamente open-source.

Então os dias da Microsoft como fornecedor dominante de sistemas operacionais para desktops, servidores e até dispositivos móveis estão contados?
Monopólios não duram para sempre, portanto acho que eles têm um longo caminho a percorrer. Mas acho que o mais importante é que o que a Microsoft está percebendo agora - e você viu que eles recentemente abriram seus protocolos e estão tentado ser uma empresa mais aberta – é que houve uma mudança fundamental na forma como as empresas criam produtos inovadores e competem no mercado. E as empresas estão fazendo isso por meio de colaboração em massa. Eles olham para empresas como Google, Facebook e organizações como a Wikipedia. Eles olham para o Projeto Genoma e para o Linux, e tudo isso está cruzando as barreiras normais do desenvolvimento e pesquisa – contratar as melhores pessoas, mantê-las fechadas, proteger sua propriedade intelectual. A Microsoft está tendo problemas para competir neste mundo.

Por que você acha que eles anunciaram que abririam as documentações?
Acho que eles o fizeram por causa dos órgãos reguladores, acho que fizeram porque metade da companhia percebe que o mundo está indo para outro modelo e que eles precisam fazer isso para competir.

Aparentemente, a Microsoft vai se encontrar com a Fundação Eclipse na próxima semana. Há alguma colaboração entre a Microsoft e a Fundação Linux?
Não no momento, mas adoraríamos fazê-lo.

O que vocês gostariam de ver?

Um lugar onde os desenvolvedores podem vir trabalhar em fazer com que o Linux tenha uma interoperabilidade mais efetiva com produtos da Microsoft. E olhamos para isto com uma visão mais código aberto, que não está presa a nenhum contrato específico, como um processo aberto em que qualquer um da comunidade possa participar.

Qual o problema de interoperabilidade atualmente?
Sempre penso que há espaço para melhorias em torno de áreas como o Projeto Samba, de pastas de arquivos; redes de máquinas virtuais, e sua gestão em diferentes plataformas.

Você falou com a Microsoft sobre isso?
Não, não formalmente. Quer dizer, penso que eles sabem que a oferta está aí.

Até onde pode ir o movimento do software livre?

O mundo está se movendo em direção a um lugar onde a colaboração em massa é fundamental para ser competitivo. Uma única empresa não pode ter todas as boas idéias. [Com] o Linux, por exemplo, o trabalho que é feito em tempo real, permitindo suporte ao kernel do Linux em sistemas financeiros de missão crítica em Wall Street, é a mesma tecnologia que vai para beneficiar o mundo móvel. Quando se fala de software livre e até onde ele pode ir, acho que parte da conversa é saber quão longe a colaboração em massa pode ir, o que é o mais importante e precedente para a segunda parte, que é: como você rentabiliza ela. Certo? Fica claro para mim que o Linux, por exemplo, e outros semelhantes - quer se trate de Wikipedia ou Facebook ou Google ou qualquer um dos outros exemplos típicos do incrível trabalho que é feito nesta colaboração em massa - são facilmente rentabilizados. A Red Hat certamente provou no mundo open-source que eles podem oferecer serviços, suporte e formação.

Não creio que as suas receitas estejam sequer perto da Microsoft ou da Oracle.
É evidente que não, porque eles são uma plataforma aberta que concorre proporcionando valor ao cliente e não tem o luxo da alta margem que o monopólio garante. Mas isso é ruim para a humanidade? Penso que não. Sim, os dias de alta margem, de dependência de um único fornecedor monopolista praticados no software empresarial acabaram, se foram para sempre.

Que inovações estão sendo planejadas para futuras versões do kernel Linux, e quando as veremos?
Bom, eu provavelmente não sou a melhor pessoa para detalhar o roteiro do kernel do Linux. Jonathan Corbet, que trabalha conosco e publica algo chamado A Previsão de Tempo do Linux, provavelmente seria a melhor pessoa para falar sobre isso. Mas eu acho que você verá melhorias no sistema de arquivos, você verá melhorias na gestão de energia e em tecnologias de virtualização aparecendo com freqüência.

O Solaris pode competir com o Linux?
Talvez se a Sun tivesse aberto a plataforma oito anos atrás, teria sido um grande concorrente efetivo para o Linux. Mas penso que, neste momento, a concorrência em torno Solaris está criando um desenvolvimento semelhante à comunidade Linux, que tem milhares de desenvolvedores trabalhando para centenas de grandes empresas em todo o mundo. Acho que eles estão muito atrasados. Esse tipo de esforço exige uma plataforma em que as pessoas tenham confiança e que estará disponível nos próximos anos.